terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

A CHEGADA

Eu, pouco tempo depois da chegada em Cascalheira.


_"Estamos chegando!"
Anunciou o piloto do monomotor, do qual eu era a única passageira. Isso, depois de muita insistência e muita lábia para conseguir que o então prefeito de Barra do Garças autorizasse a viagem no avião do governo até Cascalheira, pois a estrada , que não era asfaltada, estava interrompida pelas chuvas abundantes. O ano era 1980. Eu havia recém terminado a Residência Médica em Infectologia em S. Paulo e havia resolvido não ficar em cidade grande, a fim de atuar em um lugar onde eu fosse necessária, fizesse diferença. Havia escrito uma carta endereçada ao bispo Pedro Casaldáliga, de S. Felix do Araguaia (MT), onde expunha o meu interesse em trabalhar na região. Conhecia seus livros e me identificava com o trabalho e com as lutas travadas ali, em que a igreja, na época chamada Progressista , defendia, contra o latifúndio, os pequenos agricultores, posseiros e índios. Sinceramente não esperava resposta, por isso, quando ela chegou, fiquei perplexa. Quem me respondeu foi Bia, enfermeira e freira francesa que morava e trabalhava há vários anos em Cascalheira, pequena cidade do município de Barra do Garças, que fazia parte da Prelazia de S. Felix do Araguaia. Pouco tempo depois, veio me conhecer, junto como o médico que trabalhava com ela, mas que estava retornando a S. Paulo porque sua esposa não se adaptara ao local. Conversamos e marcamos uma ida minha para conhecer a região , seria durante um encontro com representantes que trabalhavam na área de saúde nos municípios que faziam parte da Prelazia. Foi uma viagem e tanto. Com trechos realizados por terra e outros em pequenos aviões. Adorei o lugar e o trabalho que estava sendo realizado ali. As pessoas eram simples e verdadeiras. Os poucos médicos que lá existiam trabalhavam por ideal, vivendo simplesmente como o povo, e eram felizes. Naquele encontro decidi que era ali e daquele jeito que queria exercer minha profissão.
E agora, ali estava eu, sobrevoando o lugar que escolhera para ficar. Dali de cima, parecia muito pequeno, pequenino mesmo.

_"Será que tem alguma condução me esperando lá? Porque ninguém sabe que chego hoje."
Perguntei ao piloto.
_"A Sra. pode ficar descansada eu dou umas voltinhas sobrevoando a cidade, é o aviso que tem passageiro e logo alguém vem buscar."
Respondeu ele.
Lembro de minha mãe chorando e meu pai com os olhos cheios d'água, mas me dando força para que seguisse o meu destino. Eles não conseguiam entender minha opção. Deixar de trabalhar em um grande e renomado hospital em S. Paulo, do qual tinha recebido convite, e escolher morar num "fim de mundo", ganhando muito menos.
Olhei de novo para a cidadezinha, cada vez mais próxima, e lembrei da distância que me separava da minha família, da minha casa, dos meus amigos, da minha vida, enfim.
Aterrissou levantando pó. E ali ia eu iniciar uma nova etapa da minha vida.
Olhei para trás, só vi poeira.

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